Setor de distribuição de combustíveis luta para coibir práticas irregulares
Setor de distribuição de combustíveis luta para coibir práticas irregularesFraudes tributárias e operacionais geram prejuízos estimados em R$ 29 bilhões por ano e subvertem a competição no mercado de combustíveisAgência Estado 16/11/2023O Brasil é o oitavo maior consumidor de combustíveis do mundo. No ano passado, considerando diesel, gasolina e etanol hidratado, foram cerca de 122 bilhões de litros consumidos no país. Com uma indústria desse porte, os desafios do setor não são poucos nem pequenos. Um dos principais é o combate ao mercado irregular.Estudo da FGV estimou que só em fraudes tributárias o governo federal deixou de arrecadar R$ 14 bilhões em 2018. “Não pagar os tributos gera uma diferença muito grande no setor de combustíveis. Você tem uma concorrência desleal”, explica o superintendente da FGV Energia, Márcio Lago Couto.A sonegação de impostos provoca uma concorrência desleal nos preços e impede a competição em condições de igualdade. E o processo para identificar essas empresas é demorado. O presidente do Instituto Combustível Legal (ICL), Emerson Kapaz, informou que leva de um a dois anos para descobrir que uma empresa estava deixando de recolher os impostos.“Tipificada a sonegação, a empresa entra na Justiça para adiar a cobrança. São processos longos que podem levar de três a cinco anos”, acrescenta. Quando o governo finalmente vence, tudo o que costuma encontrar é uma casca vazia. “Quando uma empresa dessas está perto de perder, a pessoa por trás dela abre outra e migra os negócios. A gente chama de sucessão pai-filho”, informa.Além disso, essas empresas em algumas oportunidades ganham a chance de limpar sua ficha aderindo a algum dos programas de refinanciamento de dívidas do governo, os Refis. “Essas empresas se utilizam de adesão [ao Refis] e ficam inadimplentes de novo”, comenta o diretor institucional da Federação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis, Gás Natural e Biocombustíveis (Brasilcom), Sergio Massillon.Para o tributarista Fábio Florentino, sócio da BMA Advogados, a complexidade do sistema tributário nacional retroalimenta o problema. “É o paradoxo do nosso sistema tributário. De um lado o sistema deve proporcionar o direito do contribuinte de se defender. De outro lado, esse mesmo processo ajuda o devedor contumaz”, lamenta.Mudanças na legislaçãoNo ano passado, o mercado regular teve uma vitória quando foram aprovadas as Leis Complementares 192/2022 e 194/2022.A primeira fez com que o ICMS do diesel, do biodiesel, da gasolina, do etanol anidro e do GLP se tornasse monofásico, ou seja, passasse a ser recolhido de uma vez só logo no começo da cadeia. Ao concentrar a cobrança em menos agentes, a lei facilita a fiscalização e tira das mãos de muitos atores problemáticos a capacidade de sonegar. “A monofasia no diesel e na gasolina vai ser responsável por uma redução brutal [da sonegação]”, analisa Kapaz.Já a segunda lei nivelou as alíquotas cobradas sobre esses produtos nas 27 unidades da Federação em 18%. “Os ganhos de arbitrar entre a tributação em diferentes Estados não existem mais. Agora não faz mais diferença se eu vendo combustível no Rio de Janeiro ou no Espírito Santo”, diz Márcio Lago.Segundo ele, a medida deverá até mesmo melhorar a logística do setor ao reduzir os “passeios” que as cargas de combustíveis davam apenas para evitar estados com impostos mais caros.Há outras propostas de mudanças legislativas ainda em análise, como o PL 164/2022 de autoria do ex-senador Jean Paul Prates, que tipifica a figura do devedor contumaz e cria mecanismo para combater essa prática. Emerson Kapaz explica que essa lei federal dificultaria que empresários migrassem seus negócios de um Estado para outro.Fraudes no varejoA tributação não é o único ponto fraco. O mesmo estudo da FGV estimou em R$ 15 bilhões os prejuízos causados por uma longa lista de práticas desonestas, como roubo de cargas e adulteração de combustíveis. Hoje, a fiscalização do setor é feita pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que tem uma série de ferramentas para fazer esse monitoramento.Entre as mais importantes, está o Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis (PMQC), que recolhe e analisa amostras de combustíveis por todo o País em busca desvios em relação à especificação. Essas ações podem, entre outras coisas, flagrar problemas como a mistura de mais etanol ou de solventes à gasolina.Segundo a ANP, os números têm mostrado uma evolução com o índice de conformidade indo de 92,7% em 2017 para 97,8% em 2022. “Os dados indicam que, nesse período, o mercado de combustíveis cresceu e melhorou”, informa por meio de nota.Para aperfeiçoar esse mercado, o Ministério de Minas e Energia (MME) propôs recentemente a criação de um operador nacional para a distribuição de combustíveis que unificaria informações geradas por diversos atores. “Criar essa instância central ajudaria a resolver o problema”, acredita Kapaz. Fonte: Agência Estado 16/11/2023