O Estado de São Paulo
A quadrilha investigada pela Polícia Federal por venda de combustíveis adulterados, com suposto favorecimento por parte de um auditor fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, se referia às propinas pagas a servidores públicos como ‘café’ e ‘almoço’.
As senhas de propina eram usadas pelos investigados quando eles discutiam sobre valores que seriam pagos a funcionários da Agência Nacional do Petróleo (ANP) responsáveis por fiscalizações nos postos sob suspeita. A ANP é vinculada ao Ministério de Minas e Energia.
A ANP informou ter afastado do exercício das atividades dois terceirizados que prestavam serviços para a agência na capital paulista. “A determinação da Justiça foi imediatamente atendida pela ANP, que segue colaborando com as investigações”, disse por meio de nota. O Estadão busca contato com a defesa dos investigados. O espaço está aberto.
Os termos ‘café’ e ‘almoço’ eram usados por Antonio Carlos da Lomba, apontado pela PF como segundo homem na hierarquia da organização criminosa que foi alvo da Operação Boyle, em fevereiro – o líder seria Antonio da Costa Rodrigues, primo de Lomba.
A PF identificou, por enquanto, três organizações criminosas especializadas em adulteração de combustível, até com uso de metanol, substância altamente inflamável e tóxica, cujo uso como combustível é proibido. Os achados dessa investigação levaram à abertura, na terça-feira, 23, da ‘Operação Barão de Itararé’, que fez buscas nos endereços do auditor da Fazenda estadual Ricardo Catunda do Nascimento Guedes, sob suspeita de corrupção e favorecimento a uma das quadrilhas investigadas na Operação Boyle por adulteração de combustíveis.
O auditor foi afastado do cargo por ordem judicial e entrou na mira da Corregedoria da Fiscalização Tributária, braço da Fazenda que coíbe irregularidades envolvendo fiscais. Os autos da Operação Boyle mostram que Catunda não teria sido o único servidor público corrompido pelo grupo. O inquérito mostra como empresários do setor de abastecimento de combustíveis organizavam o pagamento das propinas também para fiscais da ANP.
”Vamos deixar tudo pronto. E o café e o almoço também. Água de POA (nome do posto que venderia combustível adulterado) é muito boa kkk”, escreveu Lomba a um outro integrante do grupo que o havia informado, em 2022, sobre uma fiscalização que ocorreria em um dos postos de combustível investigados.
Ao ser avisado sobre a blitz da ANP, o número 2 da quadrilha investigada pela PF repassou imediatamente a mensagem para o gerente do auto posto que seria vistoriado. Mais uma vez mencionou o ‘café’.”(…) Outra coisa é que segunda-feira a gente vai ter uma visita aí. Queria me alinhar com você pra deixar tudo certo. É o mesmo veínho da ANP da última vez, seu Domingos (o fiscal) já está ciente de tudo, mas vai ter que fazer coleta e levar embora. E também por isso a gente precisava comprar álcool no galão, gasolina comum no galão e gasolina aditivada ver se está tudo OK, certinha, bonitinha ai, né? (…)
Antônio Carlos da Lomba seguiu: “(…) Mas a gasolina comum e o etanol a gente tinha que encher um galãozinho de cinco litros aí e deixar no jeito. Isso a gente faria amanhã, pra que quando ele viesse na segunda-feira de manhã a gente tivesse o dinheiro dele separado, né? Que é o café que ele gosta, e a gente pudesse encher as garrafinhas dele lá.”
Os investigadores citam ainda o uso da expressão “café piloto” por parte dos alvos da Operação Boyle. Segundo a Polícia Federal, ela está associada a pagamentos para motoristas da ANP.
COM A PALAVRA, OS INVESTIGADOS
A reportagem do Estadão busca contato com a defesa dos investigados. O espaço está aberto (pepita.ortega@estadao.com; heitor.mazzoco@estadao.com)